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Uma África não são Áfricas

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Vários escritores, desde Moçambique à Nigéria, passando por Angola e muitos outros países, foram convidados a participar numa demonstração colectiva de que um continente nunca pode ser reduzido a uma entidade homogénea.


“Que isto sirva de aviso: neste número da Granta não se pretende de modo algum retratar África. O que aqui temos – se me é permitido pilhar título alheio – são partes de África.” Assim se lê no prefácio do quarto volume da versão portuguesa da revista que publica textos literários inéditos.


À ideia apresentada junta-se o tema agregador, que muda a cada edição, e a capa expressiva – uma fotografia de Ruy Duarte de Carvalho, que não podia ter sido tirada noutro continente. Só mesmo em África.


Feitas as contas por alto, o continente africano tem cerca de 30 milhões de km2. Não pode ser tratado como uma entidade homogénea, e é precisamente esse o sentimento e o mote da reunião de textos elaborados por diferentes autores, todos com diferentes experiências e proveniências, todos com uma África diferente na cabeça.


Ruy Duarte de Carvalho, o autor da fotografia de capa, entra no coração da revista com mensagens que mandou a partir de Swakopmundi, na Namíbia, a cidade costeira onde escolheu viver. E morrer. Os escritores Mia Couto e José Eduardo Agualusa atravessam o continente com uma troca de cartas entre amigos, um de Moçambique, outro de Angola, onde até há espaço para falar de futebol: “Vejo a reacção dos moçambicanos ao assistirem aos jogos do Mundial e ao notarem a quantidade de jogadores europeus de raça negra. O mundo está baralhando as cartas? O futebol é apenas um primeiro e mais visível espaço em que as cartas do baralho humano se redistribuem?”, pergunta Mia Couto a dado momento.


E não são só as expressões de língua portuguesa que cabem nesta Granta, às quais se juntam testemunhos de Lídia Jorge, Hélia Correia, António Cabrita, Luís Carlos Patraquim ou Sandro William Junqueira – que aproveita para fazer um regresso imaginado a um Zimbabué onde nasceu mas que nunca irá conhecer.


A diversidade de Áfricas vai muito além disso. Há tanto o olhar visitante de Bruce Chatwin, como a visão muito feminina da nigeriana internacionalizada (tão difundida pelo mundo, que as suas palavras entram numa música de Beyoncé) Chimamanda Ngozi Adichie. Assim como se podiam convocar as intervenções noutras línguas e perspectivas de Teju Cole, Aminatta Forna, Martin Kimani, Taiye Selasi ou Nadine Gordimer, com a sua reflexão sobre os dezasseis-avos de sangue negro de Beethoven. E tudo acompanhado por fotografias do angolano Délio Jasse e ilustrações de Alain Corbel.


Para terminar, e como momento aglomerador de tudo o que foi dito, só podia mesmo aparecer o humor do queniano Binyavanga Wainaina com as muitas ironias sobre o tratamento que é normalmente dado a África na ficção, retratadas no texto “Como Escrever Acerca de África”. É tomar nota de dicas como “no teu texto, aborda África como se fosse um só país. É um lugar quente e poeirento, com ervaçais suavemente ondulados e enormes manadas de animais e habitantes altos e magros que estão cheios de fome”; ou então, “certifica-te que pões em relevo que os africanos têm a música e o ritmo impregnados no mais fundo da alma”; e saber que nesta Granta não se faz nada disso. E ainda bem.